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PARAHYBA    BRASIL    SETEMBRO   2025

Este é o nosso BLOG, onde você conhecerá um pouco do ARTISTA e da sua OBRA, navegando nos generosos DEPOIMENTOS sobre a minha trajetória durante esses 50 anos de ATIVIDADE ARTÍSTICA E EXPOSIÇÕES e também em inúmeras REPORTAGENS na mídia. Acompanhará os projetos que estou realizando agora: PARAHYBAVISTA; JOÃO & MARIA; FLORESTA ARDENTE QUEIMADAS. Poderá acessar nossa GALERIA VIRTUAL, me acompanhar no INSTAGRAM e visitar a MINHA CIDADE...

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sábado, 9 de setembro de 2023

UM DESFILE DE 7 DE SETEMBRO

👦
DESFILE DE 7 DE SETEMBRO:
UM ESTRANHO NO NINHO


Na imagem, entrando de gaiato no desfile de 7 de setembro, em um grupo escolar no distrito de Gramame, PB, nas proximidades da nossa granja, nos anos 60 (na foto, sou o menino com um conjuntinho tipo "safari" diferente dos demais e com  botas tipo "fole"). Reconhecendo uns alunos na formação para desfilarem, amiguinhos de brincadeiras e pescarias nos açudes da região, desci do cavalo que me levara até ali, amarrando-o em uma árvore e não pensei duas vezes...

Esta imagem abriu o meu baú de memórias da época, me fazendo flutuar por algumas delas...
Desde criança eu fazia longas e solitárias cavalgadas dentro e fora do "perímetro" permitido pelos meus pais. Todos os finais de semana nós passávamos naquele sítio; chegávamos na sexta-feira à noite e voltávamos para João Pessoa na segunda-feira bem cedinho.

Como era bastante conhecido na região como o filho "fim de rama" de Dr Isaías e de D Marieta, eu tinha livre acesso às granjas, sítios e fazendas da região - principalmente a fazenda Cuiá, com seu belo casarão de dois andares, que existe até hoje, logo depois de atravessar a ponte do rio Cuiá, no alto da ladeira, do lado direito, onde às vezes eu avistava uma linda loirinha que eu achava que era uma princesa - era a neta do fazendeiro. Todas as vezes que eu visitava essa fazenda era na esperança de revê-la... mas éramos muito crianças. Ali havia enormes e belos açudes e uma espécie de quilombo, pertinho do rio Cuiá, com belíssimas casas de taipa e palha muito bem feitas e com "pé direito" altíssimos, diferentes dos casebres comuns na região, que eu admirava e onde era muito bem recebido (sempre me serviam um "beiju", espécie de tapioca mais grosseira assada no assoalho do próprio forno de pedra durante o preparo da farinha, na "casa de farinha" deles); o local me lembrava as histórias da África que eu tinha na minha imaginação (ainda não tomara conhecimento dos horrores da escravidão no Brasil) e para mim era uma aventura, pois tinha que percorrer um longo trecho dentro da mata - onde hoje é o conjunto habitacional Valentina de Figueiredo, mas na época a região era toda rural - havia o pequeno lugarejo chamado Gramame (próximo da "Ponte dos Arcos", nas imagens abaixo, que atravessa o rio homônimo até os dias atuais e cuja estrada se liga à BR-101 e à que leva até a cidade Jacumã) e mais a leste, no caminho das praias de Camurupim (hoje Praia do Sol) e Barra de Gramame, outro lugarejo com duas fileiras de casa chamado Muçumagro  (onde na pré-adolescência frequentara um forró perto do cemitério, saindo da granja à noite, escondido, pulando a janela do meu quarto, quando meu pai e minha madrasta estavam dormindo. Ia com as empregadas e alguns filhos dos moradores, andávamos uns 4 quilômetros, ora sobre a luz do luar ora apenas guiado pelas estrelas - uma vez tivemos que pular uma cobra que estava atravessada no caminho... Mas, depois de algumas idas e vindas, fui flagrado na volta, entrando pela janela do quarto. O fim da farra não foi muito agradável...).




Cavalgava por todos esses lugares sempre sozinho, era conhecido por todos e sempre bem recebido, pois o pessoal respeitava muito papai, que além de ser um médico que socorria muita gente dali era um homenzarrão brabo pra dedéu! Hoje tudo isso é área urbana e faz parte da grande João Pessoa.


Bruno Steinbach. "Barra de Gramame" . 
Óleo / tela, 40 x 50 cm, dez 2006, 
João Pessoa, Paraíba, Brasil. 
Coleção: Maria João Pires, Salvador - Bahia.
Da série PARAHYBAVISTA - AGONIA E ÊXTASE

Sempre visitava a fazenda Camurupim, que se estendia até à beira mar, com uma longa praia que se prolongava até a Barra de Gramame. Era administrada pelo Sr. Edésio Chianca, solitário e interessante personagem, sogro do proprietário e pai do marido da minha irmã Norma, que eu adorava quando vinham de Brasília nos visitar - foram fundadores daquela cidade (todos já falecidos). Quando ele passava por mim pilotando o seu trator, fazia sinal com a mão para que eu o seguisse, reduzindo a velocidade; então eu almoçava as deliciosas peixadas que ele preparava em panelas de barro no seu fantástico fogão a lenha. Lá ele também tinha umas casas parecidas com as casas de "Jim da Selva" (personagem dos meus tempos de menino, que substituiu o "Tarzan" interpretado pelo já "maduro" Johnny Weissmuller). Uma era a sede, próxima dos galpões, estábulos e demais dependências dos funcionários - pois ali funcionava um projeto da Sudene - e a outra, que ele chamava de palacete de verão, à beira mar (na foto abaixo, onde hoje está tudo ocupado por barracas e bares). Todas as duas eram verdadeiras cabanas, feitas de troncos de coqueiro, bambu e palha muitíssimo bem trançada; tudo muito rústico, realmente pareciam recém saídas de um cenário de um filme de Tarzan ou de Jim da Selva - exigências do próprio Edésio, que adorava viver assim.

Bebendo água de coco no "Palácio de Verão". Meu cunhado José William Chianca (descascando cocos), seu pai Edésio Chianca e eu.

Essa recordação daquele local me fez mergulhar literalmente em outra lembrança: décadas mais tarde, já adulto, em uma escapadela "permitida" de um lugar onde ninguém deve sair, tomei um delicioso é inesquecível banho de cuia dado por uma linda cabocla que me visitara no tal lugar de reclusão e me convidara para conhecer o  seu estabelecimento em um dia de semana, quando não havia fregueses nem gente por perto, além de facilitar justificar-me legalmente para a saída (cá entre nós).  Ela era nativa de uma comunidade ribeirinha do outro lado do Rio Gramame  e proprietária de um dos quiosques que funcionava como bar, no mesmo local onde existira a cabana de praia do Sr. Edésio, a que me referi mais acima. Ela era muito jeitosa e tivera a iniciativa de fazer atrás uma área particular de banho, a céu aberto, com arbustos formando uma cerca de privacidade e com piso de pedras ao redor da dita nascente, criando uma banheira natural, com fundo arenoso, que acolhia perfeitamente um casal namorando e cuja água desaguava na já citada laguna.
Ah! Que delícia! Que maravilha é ter uma boa memória e que riqueza ter boas lembranças para recordar esses tesouros tão bem guardados - mesmo em tempos às vezes extremamente difíceis!
Mas vamos voltar novamente aos tempos inocentes de menino - "pero no mucho"...

Às vezes me demorava mais do que devia nesses passeios e, no amargo regresso para nossa granja, quase à noitinha, sempre havia um cipó "reservado para meu espinhaço" - mas valia a pena!

Durante uma dessas escapadelas da nossa granja Humaitá, apeei do cavalo e entrei no desfile de 7 de Setembro, organizado por um grupo escolar de Gramame, como comprovado na foto, onde encontrei vários filhos dos moradores das redondezas e coleguinhas de brincadeiras. Horas depois, papai mandou me buscar. O cabo da polícia (que era o "delegado", à época era assim) foi informado pelo esperto autor desta foto e enviou um soldado em um jeep até a granja de papai para avisá-lo do fato; um trabalhador da granja voltou a Gramame com o soldado, encarregado de buscar o cavalo, e em seguida voltei para casa em "um jeep com um cabo e um soldado". 😉
Algum tempo depois o fotógrafo sabido apareceu na granja para vender a foto 😂.
Parece que o modelo de cabelo está na moda novamente (rss).

Eu ia fazer essa publicação no dia 7, mas fiquei assistindo ao belo e civilizado desfile cívico-militar em Brasília e me esqueci. Aliás, o evento foi beneficiado com a ausência dos idiotas brucutus que confundem o "Dia da Pátria" com comício, fazendo um carnaval de baixarias, patifarias e baderna, em adoração a um falso messias, um cafajeste chamado de mito que eles elegeram - o que confirma a tese de Nelson Rodrigues que "os idiotas são a maioria da humanidade". E onde estava o povo? - perguntam os cretinos. Ora, estava em seu devido lugar, assistindo às comemorações de forma ordeira e pacífica, pois é assim que funciona entre gente civilizada.

Destaco aqui a participação representativa dos garis brasileiros, a peculiar homenagem da tropa formada por indígenas, sediada na Amazônia, a presença dos representantes de todos os três poderes e de todas as forças armadas (um simbólico gesto de união e pacificação) e a belíssima apresentação da nossa querida "Esquadrilha da Fumaça". 

E fica aqui o meu desejo - talvez um sonho utópico - de que doravante as manifestações públicas não contem com turba de cretinos, brucutus truculentos e bagunceiros, extremistas, religiosos fanáticos e idiotas. Quiçá, voltem para os esgotos, de onde jamais deveriam ter saído, e que jamais voltem a tentar estuprar a nossa adolescente democracia. 

domingo, 16 de janeiro de 2022

HOTEL O NAZARENO

HOTEL "O NAZARENO":

Um lugar quase mal-assombrado


Vida de nômade
    
  Alguns amigos me chamam de nômade, pois não gosto de demorar muito tempo em nenhum lugar. 

  Morei em vários bairros da minha cidade - só no Cabo Branco morei em três locais: no edifício Beira-mar, numa casinha em um grande terreno cheio de coqueiros no finalzinho da avenida (cuja frente dava para a praia e os fundos para a barreira, bem próximo a uma casa redonda) e no hotel desta história. Morei em três lugares na praia de Camboinha; morei em Cabedelo; morei em Tambiá (recém-nascido), vizinho ao clube Astréa, onde hoje é um hospital.  Morei em vários lugares no centro da cidade;  em Jaguaribe; morei no bairro Expedicionários (onde passei parte da infância e início da adolescência); no bairro Tambauzinho, no Bairro dos Estados (na casa da minha mana Márcia e do cunhado Kaplan); morei em Tambaú; morei no bairro do Bessa (entre 1979 e 1986) onde voltei a morar atualmente. Casei e me juntei um bocado de vezes, então cada separação era uma mudança - vida nova casa nova - além de algumas poucas vezes por falta de pagamento mesmo, pois vida de artista é que nem rapadura: é doce mas não é mole não... Morei também noutras cidades: Cabedelo, na praia de Camboinha, em três lugares diferentes; Salvador-BA, Santa Rita-PB, Natal, Barra do Maxaranguape (foragido e disfarçado) e Mossoró-RN; na granja Humaitá (nos anos 80, do meu pai, que fez uma casinha para mim entre as árvores frutíferas que me forneciam o café da manhã ao alcance da mão, além da vacaria onde bebia o leite fresco (foto logo abaixo).
Era próxima a Muçumagro, perto do conjunto Valentina de Figueiredo, que na época era uma mata. Quando criança íamos todos os finais de semana para a granja, onde tomei muito banho de açude escondido e já aos oito anos de idade cavalgava por toda a região, até a "barra" do rio Gramame).

Minha casinha de campo

 Passei uns tempos escondido na  fazenda "Sonho Meu", do meu irmão Carlos, entre Olivedos e Cubatí, também na Paraíba, próximo a Soledade. 
Isso tudo sem falar em alguns ambientes que jamais poderiam ser chamados de residências...

  Pois bem, em mais uma dessas incontáveis mudanças de minha vida  nômade, morei no hotel "O Nazareno" uns poucos meses, entre o final de 1987 e o começo de 1988.
Localizava-se em João Pessoa, Paraíba, no altiplano Cabo Branco, à beira da estrada que passava entre ele e o precipício da barreira, próximo da ladeira de acesso à "Ponta do Cabo Branco". Um pitoresco e bucólico lugar, porém longe de tudo. Ao redor só havia mata; transporte coletivo só lá embaixo, a beira-mar - aí, quando necessário ou para caminhadas na praia, descia por uma perigosa trilha, segurando-me nos galhos dos arbustos e nas raízes, para evitar o longo percurso pela estrada que dava acesso ao terminal dos ônibus, ao pé da ladeira. Mas eu tinha a minha moto e transporte não era problema.

Minha Yamaha DT 180, na época que eu morei na granja, com a qual eu só não consegui subir em árvores...

(coloquei o link para o mapa do local no final desta publicação).

  A beleza austera do antigo Convento dos Capuchinhos (como todos chamavam o "Convento da Ordem dos Frades Menores Capuchinhos") não mais existia... Como na época quando meu irmão Carlos lá se casou, no final dos "anos 60", em belíssima e concorrida cerimônia - apesar do dificílimo acesso ao local naqueles tempos - numa linda e romântica noite de lua cheia.

 

  Quando me mudei para lá, o local já estava decadente, desfigurado pelas inúmeras reformas para os mais variados usos que dele fizeram - já não era mais convento nem seminário há tempos. Já estava quase em ruínas; a piscina "fechada", cheia de uma gosma verde de lodo; sem restaurante, apenas um funcionário medroso invisível à noite (ele tinha medo de assombração - o lugar dava margem para esse tipo de coisa mesmo, à noite, com suas portas batendo, passos inexplicáveis e os assobios arrepiantes do vento que sugeriam sussurros) e o próprio proprietário, um homem muito estranho, que, mesmo sendo um milionário dono de quase todas as terras da região, visitava o local todos os dias, muitas vezes substituindo o porteiro para não ter que pagar outros funcionários. O "misto" de zelador e porteiro caía fora à noite, abandonando o seu posto, sem o patrão saber, para dormir em sua casa, nas proximidades. 


  Foram incontáveis as noites que eu sabia que era o único ser humano naquele edifício enorme, apesar de ter certeza que não estava sozinho...

  

  Apenas cinco apartamentos estavam operacionais, muito precariamente, no primeiro andar daquela ala voltada para o mar (inclusive o que eu alugara) alugados mensalmente por sujeitos separados recentemente e ocupados ocasionalmente por casais "desavisados". O restante do prédio estava abandonado, nada funcionava (acho que havia uma questão na justiça entre o proprietário e a Ordem dos Frades Capuchinhos - que construiu o prédio no terreno cedido por ele, creio eu - ou ele queria vender o local, daí deixou chegar a esse estado). 

Aluguei  também duas salas no segundo andar abandonado e lá instalei meu atelier e cozinha.

  

  Eu apelidei o estabelecimento de "hotel bom Jesus": de dia falta água e de noite falta luz... Fiquei por lá até a casa que eu esperava na praia de camboinha desocupar e eu voltar para lá. 

  

  Mas medroso não passava mais de um dia ali... Quando alguém chegava para se hospedar eu ficava na espreita, me divertindo com as reclamações que o porteiro "faz tudo" recebia. Uma vez eu disse a um desses incautos: "Você ainda não viu nada... espere a noite chegar. Este prédio foi um convento dos Capuchinhos e morreram muitos frades aqui, dá para escutar o arrastar das suas sandálias, à noite." Geralmente o sujeito pagava a conta e dava nos pés. 

  

  Eu me habituei com os barulhos esquisitos, pois nunca tive medo de almas penadas (mas sei que elas existem). Nunca cheguei a ver vultos nem coisas desse tipo. Mas sentia algo no ar. Foram inúmeras as vezes que notei sutis mudanças em pinturas que estavam em andamento - alterações para melhor, ainda bem... objetos que sumiam e depois apareciam no mesmo lugar... esse tipo de coisa... Como na época eu às vezes fumava uns baseados ou calibrava no whisky,  não dava muita atenção... rezava e que Deus tomasse conta! O que sei é que se o lugar era mal-assombrado era só para os outros, pois para mim deu muita sorte. Pintei e namorei bastante lá; em noite de lua cheia, vinho e queijos na torre do mirante (na quina do edifício, à direita, na laje, junto da caixa d'água que se vê na primeira imagem), de onde se avistava até Cabedelo, lá ao longe. Nunca fui realmente incomodado pelos fantasmas; acho até que me protegeram de ladrões frouxos que poderiam ter invadido o local - quase desabitado e sem a mínima segurança.


  O "Dia D" que decididamente fez com que eu me mudasse às pressas daquele lugar esquisito e nefasto foi quando escapei por pouco de um assalto... Ia chegando à noite, na moto, quando escutei tiros e pessoas correndo. Acelerei e entrei no mato por trás da área da piscina e me escondi. Depois, quando voltei, com movimento da polícia e da ambulância, soube que os assaltantes levaram um carro e feriram o seu proprietário (o episódio foi bastante divulgado na imprensa e os bandidos usaram o automóvel para outros assaltos; a vítima que estava no hotel ainda teve que se entender com a esposa, pois não era ela a que estava com ele na ocasião). Ainda bem que me mudei na mesma semana. 


  Tempos depois, abandonado, o local foi invadido por "Sem Tetos" e tornou-se um imenso e insalubre cortiço. 


  Hoje em dia está reformado e transformado em área de recepções e de lazer de um condomínio de luxo - cujos moradores nem de longe imaginam o que já aconteceu entre aquelas paredes...

Veja no GOOGLE MAPS



  

  Mas vivi bons momentos de amor e de inspiração lá; a tranquilidade e  a impressionante visão panorâmica compensavam quaisquer contratempos e os fantasmas não me incomodavam - talvez por serem de antigos frades Capuchinhos, homens bons, de uma estirpe totalmente diferente da desses "fantasmas"  muito vivos que infestam os gabinetes da maioria dos políticos brasileiros.


  E tenho certeza que as minhas tórridas noitadas de amor no antigo convento eram bastante apreciadas pelos entediados e castos fantasmas, pois o silêncio era total nessas ocasiões - nada de ruídos esquisitos nem arrastar de passos... apenas os nossos próprios sussurros e gemidos...





NOTA DE RODAPÉ

Apesar de não seguir nenhuma religião, pois prefiro conversar diretamente com o Divino, gosto de pesquisar o assunto, na tentativa de diminuir a minha própria ignorância.

Convento, Mosteiro e Seminário

Convento, do latim conventu(m), ajuntamento, é o edifício habitado por pessoas religiosas que vivem em comum e como irmãos. Chamam-se frades (irmãos) e freiras (irmãs).

Mosteiro, do grego monastérion, de monázo, viver só, é aquele edifício religioso onde vivem os monges ou as monjas, governados por um abade ou uma abadessa. O mosteiro dá-nos a ideia de solidão. Sabemos até que havia mosteiros em que os monges levavam vida contemplativa, e eram construídos fora dos povoados.

Seminário é um local onde jovens ficam ou passam com objetivo de estudar para se tornarem Eclesiásticos.

A vida religiosa nasceu, cresceu e se desenvolveu do húmus do Evangelho. Os três fundadores das Ordens religiosas anteriores a São Francisco (São Basílio, Santo Agostinho e São Bento) foram os organizadores deste modo de vida em comunidade. Eles coordenaram a experiência religiosa dos seus primeiros seguidores, à serviço da Igreja na pregação, educação, assistência aos doentes, vida de oração e penitência, estruturando essa experiência num contexto eclesial organizado e institucionalizado em fraternidades. Assim, nascem as instituições de religião, denominadas: instituição de religião eremítica (São Basílio); instituição de religião canonical (Santo Agostinho); instituição de religião monástica (São Bento); e mais tarde, a instituição de religião apostólica (São Francisco de Assis).

A instituição eremítica caracteriza-se pelo abandono do mundo, para viver somente para Deus e por Deus. Porém a vivência eremítica não é total. Nessa instituição, os seus membros vivem momentos de afastamento (solidão) e momentos comunitários (laura + cenóbio). A laura expressa a forma de vida dos que passavam a maior parte do tempo nas grutas, em meditação, contemplação, vida de jejum a pão e água, penitência e artesanato. O cenóbio expressa a forma de vida comunitária, ao redor do mosteiro. Significa que os monges passavam durante a semana nas grutas e no sábado, voltavam ao cenóbio para celebrar a liturgia, o encontro fraterno e reabastecerem-se de material necessário ao artesanato, pão e água para mais uma semana vivida nas grutas e cavas do deserto. Ainda hoje encontramos eremitérios neste estilo de vida, sobretudo na Palestina, na Grécia e em outros locais, onde os monges vivem parte do tempo em grutas e parte do tempo em comunidade.

A instituição canonical sistematiza-se pelo seu estilo clerical, sendo religiosos presbíteros, dedicados aos trabalhos apostólicos. Exemplo disso são os canônicos de Santo Agostinho.

A instituição monástica evidencia-se pela renúncia da família por causa de Cristo. Em compensação, a oferta da ajuda fraterna faz com que os seus membros dediquem-se em ser dom aos irmãos. Sustentar a fragilidade dos irmãos do mosteiro é desafio constante. Toda a responsabilidade na condução deste modo de vida recai sobre o Abade. Os seus membros ao professarem os votos, destinam seus bens ao próprio mosteiro. A pregação, por sua vez, somente é possível com o mandato do Abade. O monge que recebe esse mandato, permanece como monge, mesmo tendo recebido uma missão temporária no meio do povo de Deus. Exemplo disso podemos encontrar nos monges beneditinos.

A instituição apostólica tornou-se uma novidade no cenário das instituições tradicionais na época medieval. Francisco de Assis era uma pessoa muito simples, despreocupado com a vida organizada em mosteiros ou outras estruturas de seu tempo. A sua pretensão era formar uma fraternidade, composta de Frades Menores, tanto leigos, quanto clérigos. Existiam outras estruturas, bem organizadas, que favoreciam todas as condições para alguém que quisesse ser religioso, tais como a estrutura eremítica, canonical ou monástica. A estrutura monástica, por exemplo, já era configurada na história da Igreja por vários séculos, com a sua famosa stabilitas loci, favorecendo um programa estável de habitação, louvor a Deus e trabalho (ora et labora). Os monges entravam no mosteiro e recebiam todo o conforto necessário ao seu bem temporal e espiritual, sempre sob o regime estável de governo do abade. Neste estilo de vida não faltava nada ao candidato. Além do mais, já era devidamente reconhecida a sua estrutura jurídico-canônica, sem correr o risco de caminhar paralelamente à comunhão eclesiástica, em confronto com os movimentos heréticos da época. Francisco não entrou numa destas estruturas do seu tempo, porque não se encontrou naquele ideal de vida, fechado, enclausurado. Inspirado por Deus, preferiu seguir um estilo de vida itinerante, que fosse além das muralhas de Assis, além dos confins de uma diocese ou de um mosteiro medieval. Indo a Roma, recebeu a aprovação da Igreja, acontecendo assim a fundação da Ordem dos Frades Menores.

Os ramos femininos da vida religiosa consagrada brotam do desmembramento destas instituições, formando assim as ordens ou congregações contemplativas ou apostólicas, de acordo com a tradição do seu fundador ou nas novas propostas, reconhecidas e aprovadas pela Igreja.

O Convento é confundido, muitas vezes, com Mosteiro.

A raiz inicial da diferença entre Convento e Mosteiro está relacionada com a sua fundação, ou seja, os frades vivem desde o início em Convento e os monges, vivem em Mosteiro. No Convento, os frades se reúnem temporiariamente para a vida fraterna em comum (oração, partilha dos trabalhos internos e externos, momentos de recreação). Vivem em modo diferenciado dos monges, porque a vida dentro do recinto do Convento é passageira, uma vez que a missão dos frades é itinerante. Já os monges vivem na estabilidade quase absoluta dentro de um Mosteiro. No Convento existem frades (freis) não ordenados ordenados (irmãos) e frades ordenados. Cada um segue a vocação a um chamado, seja para os ministérios não ordenados, seja para os ministérios ordenados. No Mosteiro encontramos a mesma configuração, relacionada ao sacramento da ordem ou não, ou seja, existem monges irmãos e monges sacerdotes. O guardião é o superior do Convento. O abade é o superior do Mosteiro.


Fui beber nas seguintes fontes:


PARÓQUIA VIRTUAL (FREI IVO MÜLLER)
http://paroquiavirtualfreiivo.blogspot.com/2010/08/diferenca-entre-convento-e-mosteiro.html?m=1

CIBERDÚVIDAS
da língua portuguesa
https://ciberduvidas.iscte-iul.pt/consultorio/perguntas/mosteiro-e-convento/818


domingo, 4 de julho de 2021

VIAJANDO PELO TEMPO NO ZEPPELIN PRATEADO: BARRA DE MAXARANGUAPE

   BARRA DE MAXARANGUAPE


  Sobrevoando o passado no meu ZEPPELIN PRATEADO* reencontrei a antiga caverna, meu refúgio em Maxaranguape, quase do mesmo jeito - de novidade apenas os coqueiros e ciprestes que estão maiores, o muro (antes era uma rústica cerca de varas com mudas de ciprestes) e um "puxadinho" lateral que não havia. Ah! E o asfalto cobrindo a antiga estrada de barro pouco usada quase sempre deserta à época e que por onde hoje transitam turistas do mundo inteiro.


  Era uma casa muito isolada; não tinha paz então não tinha nada. Apesar da tranquilidade e do isolamento do local (cheio de casas vazias, apenas ocupadas por veranistas poucos dias no ano), não encontrava a paz interior que esperara encontrar com outra identidade. Me escondi ali por 8 longos meses, enquanto se arrastava o ano de 1988... 


  Eu estava com um enorme peso nas costas, descobri que não foge da culpa quem dela tem consciência; resolvi regressar e enfrentar o que me esperava: o inexorável julgamento. Então, sozinho, iniciei a preparação para me prostar aos pés de Têmis e meu grande pecado pagar.


Era uma casa muito isolada: não tinha internet, nem telefone, nem rádio, nem TV, nem automóvel; levei uns livros - inclusive "100 Anos de Solidão" e "Memórias do Cárcere"; pintei muito nesse período... meu falecido irmão Marcelo, que morava em Natal, mensalmente vinha buscar o que eu produzira para a galeria de arte de uma grande amiga e marchand, ocasião que trazia material e dinheiro em espécie que me eram enviados por familiares de João Pessoa, pois não sabiam onde eu estava e ficou combinado que tudo seria resolvido através dele (pensavam que eu estava em uma fazenda no Ceará).
  

Caminhava muito pela praia todos os dias, descobrindo maravilhas da natureza, o lugar é belíssimo. Foragido, estava disfarçado e desconfiava até da própria sombra. Frequentava o canteiro de obras do farol do Cabo São Roque (ao fundo na foto da árvore), cuja construção literalmente acompanhei ao lado dos operários com quem fiz amizade - havia um que tocava violão e frequentemente nos reuníamos aos domingos, ao redor da fogueira, perto da árvore do amor (duas árvores que o vento entrelaçou, formando um só conjunto). Estranhavam o meu retiro, mas se conformavam com a desculpa que era um artista preparando uma exposição - o que não era mentira, apenas o nome era outro... E, afinal, cada qual tinha seu cada qual...

  
  A esperança estava escapando, pois sentia que o inevitável estava rondando e teria que ir para o enfrentamento - mais cedo ou mais tarde. Além da solidão tremenda e dos riscos, a paciência de todos estava no limite, eram muitas as dificuldades e despesas para conseguirmos manter todo um complicado esquema de segurança.


  Mas, no vilarejo distante, na barra do rio Maxaranguape, havia uma linda promessa morena, a formosa professorinha do lugar, que vi logo na minha chegada com a mudança ao vilarejo. A conheci algum tempo depois, em uma das minhas idas à feira local . Uma belíssima escultura viva de ébano! Confesso que a sua beleza foi o que me atraiu, destacando-a das demais moradoras daquela praia - principalmente quando retribuiu meu primeiro olhar com um lindo sorriso. Ficamos assim, em flertes fugazes que o acaso proporcionava, de vez em quando. 


   Meses depois, começamos o namoro na noite de ano novo, em romântico encontro mutuamente esperado no silêncio imaginativo do intenso e recíproco desejo, expresso na troca de furtivos olhares nos dias de feira... encontro finalmente acontecido na praça principal da cidade, quase à beira-mar, ao pipocar colorido dos fogos de artifício da colônia dos pescadores, na beira do rio.


  Sua família era muito bacana e me tratava muito bem, frequentei a sua casa - em namoro assistido... Ela além de linda e simpática era de uma simplicidade e de uma meiguice encantadoras, que encobriam sua fortaleza de caráter e seu conhecimento e gosto por história, literatura e arte - algo raro entre a gente daquelas plagas; isso realmente me impressionou e cativou. Mas nos conhecemos já próximo da minha partida inadiável e sem certeza de volta. A ela eu contei toda a verdade, recebendo em resposta seu sempre maravilhoso sorriso e um abraço, me sussurrando que já sabia, pois alguém havia lhe mostrado uma foto minha estampada em jornal paraibano... e apesar de estar disfarçado em um "louro oxigenado", ela me reconhecera (minha cara estava estampada em todos os jornais quase que diariamente, em matérias pagas publicadas por gente venal).


  No jornal que ela me mostrou, saíra a notícia de um "habeas-corpus" preventivo que me fora concedido pelos desembargadores (que eu já fora informado)... não estava mais sendo procurado e era a hora de me apresentar, de livre e espontânea vontade, como deve fazer um Homem - e não levado à força, preso. Parti então no Zeppelin prateado para cumprir a minha sina e receber o meu castigo, levando e deixando saudade. Prometi que um dia iria voltar, mas o labirinto da vida e do tempo nos desencontrou...


  Agora, sobrevoando no tempo da memória, está me dando uma enorme vontade de voltar lá; uma arrebatadora e crescente saudade... uma saudade de um amor que não houve, mas que poderia ter havido. Uma saudade do que eu poderia ter vivido...

* O "Zeppelin Prateado" é a minha nave virtual que me leva a todos os lugares do mundo e a todos os recantos da memória sem que eu saia da "caverna" (como eu chamo meu atelier).



sábado, 13 de junho de 2020

A VITALINA E O SANTO


Hoje é o dia de Santo Antônio, o santo casamenteiro. 
Como estou em isolamento voluntário e a namorada está longe, estou seguro. Sou devoto mesmo é de São Francisco e de Santa Dulce dos Pobres (a Santa que era amiga da minha mãe). Mas, me atrevi a escrever um pequeno conto ou crônica, inspirado nos "causos" populares. Tomara que gostem e que o Santo funcione para quem precisa!


A VITALINA E O SANTO 
A crônica de um fim anunciado 
A estória da moça veia que jogou Santo Antônio pela janela

I

O COMEÇO DO FIM 

   Era o dia de Santo Antônio, o Santo casamenteiro. 
Vitalina estava olhando tristemente para a estatueta de madeira pintada do seu Santo de devoção, instalada desde sempre no pequeno nicho na grossa parede, acima do oratório, um aparador barroco, num canto da saleta do antigo casarão colonial da linda e pacata cidade serrana do interior da Paraíba. 
   
Estava amargurada e frustrada; há muito tempo, todos os anos, rezava e fazia promessas para o Santo lhe conseguir um marido... e nada! Já estava honrando o nome de batismo, insensatez cometida pela sua mãe para pagar uma promessa que fizera se conseguisse casar. Ela não era uma mulher bonita, mas também não era das mais feias e a família tinha posses – o que facilitaria um bom dote para atrair um noivo. “Parece uma praga”, pensou a moça velha. Então, num ímpeto, pegou a escultura do Santo e correu para o enorme janelão que dava para a calçada da rua enladeirada e pouco movimentada, por onde o jogou com força e raiva, aos gritos: 
   - Nunca mais acredito em Santo do pau oco! 

II

SUBINDO A LADEIRA 

  Celibatário parou na escadaria da igreja na praça principal, desistindo de entrar. Iria fazer uma oração para Santo Antônio, como fazia todos os anos, esperançoso que um milagre lhe arranjasse uma esposa. 
   - “Pôrra! Esse santo do pau oco não faz nada por mim!” – pensou em voz alta, se lastimando pelo nome com que lhe batizaram. Deu meia volta e resolveu ir almoçar. 

  Ele tinha um pequeno escritório de contabilidade na cidade, instalado na própria residência, que lhe garantia modestamente o sustento. Ele era um sujeito magro, acanhado, sem nenhum atrativo físico; donzelo solitário, morava sozinho; metódico, sem vícios. 

  Sua vida se resumia ao trabalho e às missas domingueiras; saia apenas para tratar de assuntos do seu monótono cotidiano, para o café da manhã na padaria, idas eventuais ao único banco do lugar e para subir a ladeira que levava ao pequeno restaurante caseiro de Dona Lia, onde almoçava e jantava quase todos os dias e também onde encomendava marmitas entregues a domicílio. Estava fazendo frio e ele estava de casaco e chapéu. 
   
  Celibatário estava subindo a ladeira e viu umas pichações #ForaBolsonaro no muro alto ao lado da casa do coronel Cornélio e pensou como o pais estava se transformando numa merda, idiotas no comando, desdenhando do conhecimento e opinando sobre tudo e acima de todos... 

  Estava matutando sobre essas coisas, passando pelo casarão da solteirona Vitalina, quando um santo de madeira voando pela janela acertou bem no meio da sua testa, derrubando-o no chão. 

III

O FIM DO COMEÇO 

   Vitalina ouviu um grito de homem e debruçou-se na janela para espiar o que acontecera. 

   Assustada, viu que havia acertado o santinho na cabeça do homem, por onde escorria um filete de sangue. 
   
Chamou a mãe, Dona Edivirgem, e correram para acudir o infeliz. Com esforço, colocaram-no dentro da casa, no sofá da sala de visitas. Dona Edivirgem foi buscar a maletinha de farmácia e fizeram um curativo no pequeno ferimento do homem, que estava acordando. 
   - O que houve? Onde estou? - perguntou, passando a mão no curativo do lado da testa. 

  As duas se entreolharam e resolveram contar a verdade. Se desculparam e todos acharam graça. Convidaram o moço velho para almoçar e o instalaram no quarto de hóspedes. A mãe foi para a cozinha dar as ordens para o almoço e Vitalina ficou no quarto com Celibatário, acomodando o hóspede na cama, sentados lado a lado.

 Acharam estranho nunca haverem se encontrado numa cidade tão pequena, onde todos se conheciam. Se olharam longamente quando a coxa dela escostou na perna dele, causando arrepios e tremores libidinosos em ambos; ela sentiu a calcinha ficando molhada e olhou para o volume crescente entre as pernas do homem, que teve uma ereção jamais acontecida...então  o milagre aconteceu! 

  Estavam tão ansiosos, excitados e cheios de tesão guardada que se abraçaram e fizeram amor ali mesmo, sofregamente, entre cheiros, sabores, gemidos e sussurros abafados de prazer e gozo, em um demorado vai e vem gostoso e frenético de sensações alucinantes, quando foderam pela primeira vez na vida. 

  Se a mãe viu ou ouviu, fez que não viu nem ouviu... demorou para chamar o casal para almoçar... O pai estava na fazenda e foi o último a saber... 
   
Estão casados até hoje, com uma penca de filhos correndo pelo quintal do casarão. Atirou o Santo e acertou no milagre. 

É... O Santo também escreve certo por linhas tortas.

Bruno Steinbach. "Anjos Caídos". 
Acrílica/tecido preparado (estandarte), 100 x 140 cm, 1995, Mossoró, RN, Brasil.